Vamos falar sobre matrizes
Reflexões exaltando o poder e a magia dessas estruturas matemáticas
Prof. Rafael Gabler Gontijo
1/30/20253 min read


Hoje quero falar sobre matrizes. A primeira vez que me deparei com um estudo em nível superior um pouco mais aprofundado sobre essas estruturas matemáticas foi no curso de "Introdução à álgebra linear", disciplina apelidada carinhosamente de IAL pelos alunos que a cursam. Precisei cursar essa disciplina na ocasião de meu curso de graduação em Engenharia Mecânica na Universidade de Brasília no ano de 2003. Esses cursos geralmente são ministrados por professores da matemática, que passam por um processo de formação acadêmica muito diferente daquela dos alunos da Engenharia. Para mim na época era difícil perceber com profundidade o impacto desse estudo sistematizado das propriedades e estruturas de matrizes e como construir relações e teoremas para operar algebricamente com essas entidades. Era tudo muito abstrato e eu definitivamente não tinha maturidade intelectual para absorver o potencial dessa disciplina. Inclusive, isso acontece com frequência assustadora com inúmeras outras disciplinas do gênero.
Alguns anos depois, quando comecei a fazer iniciação científica na área de modelagem computacional de escoamentos turbulentos, a primeira tarefa que meu orientador me passou foi: "Escreva um programa de computador em FORTRAN que resolva um sistema linear de ordem N utilizando eliminação Gaussiana." Na hora entendi que precisava dar um jeito de aprender álgebra linear se quisesse progredir naquele projeto de iniciação científica. Fui para a biblioteca meio desesperado e passei 2 semanas estudando técnicas de solução de sistemas lineares enquanto aprendia a instalar o compilador de FORTRAN no meu computador pessoal. Consegui cumprir a missão com razoável êxito e tive uma trajetória acadêmica até bem sucedida na construção de uma carreira sólida como cientista e professor de lá pra cá.
Mas no fundo eu sempre sentia que precisava amadurecer com mais profundidade o meu entendimento sobre álgebra linear. Quando me propus a ministrar um curso de Mecânica dos Meios Contínuos já pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Mecânicas da UnB me lancei num abismo para dar de cara com toda a minha ignorância e ir atrás de aprimorar o meu entendimento sobre o poder real dessas estruturas matemáticas incríveis que chamamos de matrizes. Na verdade, a Mecânica dos Meios Contínuos eleva o grau de generalidade dessas estruturas matriciais para um equivalente super poderoso e multidimensional chamado "tensor". Esses dias vi um meme falando que tensores eram matrizes sob efeito de asteróides. Não discordo. Existe certa sabedoria na piada.
Fato é que matrizes surgem como uma necessidade que temos de alocar informações de uma maneira ordenada para podermos utilizá-las conforme a necessidade realizando operações matemáticas, geralmente algébricas, para podermos resolver determinado problema de interesse. Todo sistema físico é passível de ser descrito matematicamente em termos de equações diferenciais. O processo natural de transformação por técnicas aproximativas dessas equações complicadas em sistemas algébricos discretos leva ao surgimento natural de sistemas lineares ou não-lineares de equações acopladas que se constroem em termos de matrizes e vetores. Todo programa de computador desenvolvido com o propósito de realizar simulações de fenômenos físicos passa pela necessidade de escrita de um algoritmo eficaz para a solução de sistemas de equações expressos em termos de matrizes.
A compreensão dos teoremas e ideias centrais da álgebra linear é fundamental para que possamos chegar no coração dessa ciência elegante e sofisticada que chamamos de "cálculo numérico". Esse é um assunto fascinante e no momento estou na minha terceira fase de imersão nesse processo de cavar ainda mais fundo nesse buraco sem fim para preparar um novo curso esse ano de "Cálculo Numérico Aplicado". Esse curso vem se formando como um desejo da minha curiosidade há algum tempo já e sinto que o timing das coisas se organizou para que ele começasse a ser gestado nesse momento. A ideia é preparar o curso para ministrar para os alunos de graduação em Engenharia Mecânica da UnB quando o novo fluxograma passar a valer. Até lá pretendo fazer um ensaio antes, ofertando a disciplina de "Métodos numéricos em Ciências Mecânicas" para os alunos do Programa de Pós-Graduação em Ciências Mecânicas da UnB no próximo semestre.
Muitas pessoas tem me perguntado se esse curso vai entrar no Ciência e Brisa (YouTube) e a resposta que posso adiantar é não. Pretendo sistematizar esse curso num outro formato para tentar alavancar recursos para bancar projetos mais ambiciosos que me permitam continuar exercendo esse ofício maravilhoso de professor e cientista com mais condições de fazer um trabalho que impacte positivamente um número maior de pessoas e que me permitam oferecer uma condição mais digna para aqueles que amo.
Prof. Rafael Gabler Gontijo